quinta-feira, 22 de março de 2012

Route 66

     Parei o carro em Chicago, só para ter o gostinho de ver o começo da “Route 66”. Já passava da meia-noite e o céu estava claro e limpo, e eu nunca tinha visto tantas estrelas. Era noite de lua cheia e a estrada se estendia branca à frente. Por quilômetros a única coisa que se via era a estrada nevada e os campos nevados e neve caindo por todos os lados. Em algum lugar à frente, fogos de artifício explodiam no céu estrelado, brilhando ao longe. Era noite de ano-novo, todos comemoravam nesse grande país. Eu deveria estar em casa, brindando e comemorando com minha família, recebendo elogios e abraços, mas não, eu estava a mais de 6.500 quilômetros de casa, em um país completamente diferente de tudo o que havia no meu, onde tudo me encantava, me excitava, me deixava tonto, tantas eram as informações e emoções. Meu objetivo era Santa Mônica, Califórnia. Entrei novamente no carro (que no momento exalava um cheiro forte de gasolina) e parti para a costa Oeste. Liguei o rádio e curti The Doors, The Vines e Pink Floyd até o posto mais próximo.
     Aquele posto parecia um oásis no meio do nada – e era o primeiro sinal de vida que eu via até agora-, tinha tudo que alguém precisava em uma viagem como a minha. Mas quebrou um pouco a minha viagem surreal, foi como se eu voltasse no tempo. Voltasse não. Como se eu tivesse ido para o futuro e as únicas coisas que me ligavam ao passado, eram as músicas e o velho Dodge. Gastei alguns dólares em gasolina, e o cara me disse que o tanque estava vazando, mas ficaria mais caro consertá-lo do que gastar alguns dólares a mais em gasolina. Ele encheu uma garrafa com gasolina pra mim e eu enrolei em alguns trapos velhos, para não esfriar demais. Entrei na loja de conveniências do posto, a única coisa que se via, em destaque, eram Coca-Colas e Ruffles de uma porção de sabores. Fui direto ao caixa e pedi um maço de cigarros baratos. O cara pegou meu dinheiro sem fazer um ruído e me entregou o maço. Pulei no carro e arranquei. Alguns quilômetros adiante, um cara alto e magro estendeu o dedão, ele devia estar congelando. Parei o carro no acostamento, alguns metros a frente, e logo o cara entrou, agradecendo e esfregando as mãos. Perguntei seu nome e de onde vinha e o cara começou a falar. Ele tinha um modo muito próprio de falar. Não as palavras que usava, mas o modo como movia os lábios. Ele tinha um sotaque arrastado, mas na verdade eu acho que tinha bebido um pouco. “Meu nome é Burrows”, disse ele. “Cara eu estou indo para o Kansas, minha garota está sozinha há muito tempo. Eu estava rodando o país, mas fiquei sem grana e decidi voltar.” Ele falou por horas. Falou de música, livros, filmes, falou de Nietzsche, Bukowski e Kerouac. Falou, falou e falou. Deixei ele no Kansas, mas sem sair da “Route”.
     Chegou o momento que tive que encostar o carro no acostamento, pois a neve estava tão densa e forte, que não saía do para-brisa. Tranquei as portas e me recostei no banco de trás. Quando o sol chegasse, poderia andar tranquilamente sem o empecilho da neve.
     Acordei com o sol batendo em meu rosto. A neve já não estava tão grossa e a nevasca já havia passado. Era um lindo dia aquele 1º de janeiro, parecia um cenário de um filme bem elaborado. A neve continuava estendendo-se sobre a pista, branca, mas suja de tantos pneus que a haviam achatado. Os fogos já haviam cessado, mas as celebrações não. Continuei dirigindo para o oeste, só eu e meus cigarros e o Syd Barrett berrando nos alto- falantes. Estava ansioso para ver Dane e para chegar à cidade feita de sonhos, onde a neve é uma realidade próxima, mas distante, e onde eu pudesse ver o pôr-do-sol nas areias douradas e ouvir o barulho do oceano logo adiante. E quando alguém me perguntasse porque eu vim de outro país até aqui, eu não precisaria responder. Eu apontaria o pôr-do-sol no horizonte e todas as perguntas seriam respondidas.

- Barbara Schuch

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